domingo, 25 de abril de 2010

O que vê o senhor presidente

Eu, assim coisas importantes que gostava de ter visto, era o senhor presidente da Câmara de Matosinhos a lutar contra as portagens que os seus amigos do Governo nos vão impingir. E também gostava de ter visto o que viu o árbitro que, em Setúbal viu o que fez o colombiano Falcão para ser amarelado. E gostava de ter visto, porque eu sou assim: gosto de ver tudo e estes momentos falharam-me.
O senhor presidente vê razões para que a ameaça das portagens se concretize. O senhor árbitro, viu razões para impedir o avançado do F C Porto de defrontar o Benfica. Não quero com isto insinuar que o senhor presidente, ou o senhor árbitro vejam mal as coisas. Isso seria injusto. A História, a grande História, está cheia de momentos em que apenas poucos viram o que todos deviam ver. A esses poucos costumamos chamar visionários.
Ora estes senhores podem muito bem ser visionários. Não viram a sarça ardente que viu Moisés, nem a ressurreição de Cristo de que Tomé duvidava, nem o sinal da cruz que viu Constantino, ou as cinco chagas que iluminaram Afonso Henriques. Mas, o senhor presidente viu que os senhores do governo têm razão para portajar vias sem alternativas. Não digo que as razões não existam – se o senhor presidente as vê é porque existem. Bom era que sua excelência demonstrasse aos incréus (com eu) e aos descrentes (como nós) a justeza desta medida.
Outra coisa que gostava de ver, mas não consigo, é a enorme diferença de políticas entre o PS – que em Matosinhos ganhou as últimas autárquicas – e a do PSD – que em Matosinhos ganhou já no prolongamento, perdão na coligação. É seguramente abissal, tanto mais que partidários de um e outro berram consistentemente as suas razões no Parlamento. Mas, do mesmo modo que os daltónicos não vêem as cores que estão à vista de tantos outros, assim não vejo eu o que o PS fez que o PSD não teria feito neste caso das portagens. Creio bem que os dois podiam era coligar-se naquilo que realmente sabem: Obras!
Bem sei que quando estão na oposição tanto o PS como o PSD são contra as obras (é por isso que os não distingo), mas como estão sempre a favor quando estão no Governo (e por isso não os distingo) podiam antes andar juntos no Governo e na oposição.
Era mais fixe!

domingo, 11 de abril de 2010

Advogados assim “Belos”? Não, não há!

É suave sentimento o recordar os mortos. Não desameis o amigo dos túmulos, que esse há-de ser sempre o menor tropeço que vos embarace os prazeres da vida.
Agora direi como veio a ponto este eco das sagradas escrituras.
No último número do MH, ao lado do anúncio da “Cerimónia de Homenagem Aníbal Belo” um brilhante texto assinado por Joaquim Queirós, terminava com uma pergunta: “como seria a humanidade se houvesse por aí mais belos como este Aníbal foi?”
Tive a felicidade de ter nascido no mesmo lugar que ele: Subportela, aldeia do Minho próxima de Viana. E de com ele ter convivido. Era o amigo mais velho e mais instruído que apontava aos amigos os ideais da justiça e liberdade. Utopia! – confessava-me mais tarde. Conheci-o muito antes de – como ele gostava de dizer - se ter aburguesado… e ter vindo para Matosinhos.
Já não há advogados assim. Talvez, o meu amigo Carlos Oliveira – o único jurista que conheço dotado de equivalente riqueza interior. Porque digo isto?
Um cliente abastado, procurava-o e propunha-lhe os seus direitos à propriedade de outrem, que a possuía também com os seus direitos. O jurisconsulto cotejava as razões de ambos, e dizia ao seu cliente que era injusto de sua parte o litígio. Replicava o cliente que as suas razões não eram, bem o sabia ele consulente, inteiramente infalíveis; porém, confiado no talento do seu insigne patrono, esperava vencer a causa, e prometia ser na paga liberalíssimo. Aníbal Belo, redarguia que não aceitava procuração para patrocinar um roubo. O consulente saía, não voltava, e aconselhava os seus amigos a evitá-lo.
Outro cliente, uma dama de ilustre nascimento, procurava o jovem jurista para o encarregar de levar pelos cabelos ao tribunal e à cadeia uma sua empregada que vivia senhorilmente a expensas de seu marido. O advogado, com delicadeza e urbanidade, lembrava à ciosa senhora que o nome de seu marido seria enxovalhado nos tribunais. A dama dizia que não viera pedir conselhos e saía para divulgar que o famigerado letrado indultava a libertinagem dos maridos.
Aparecia depois a empregada, pedindo ao advogado que a defendesse da acusação da dama. Alegava em seu favor as razões que Aníbal adivinhara. Este aconselhava-a a que procurasse ser honesta e laboriosa noutro lugar. A empregada saía dizendo que o doutor Belo só defendia criminosos ricos.
Aburguesou-se depois – gracejava ele. Eu diria que o projecto inicial da natureza foi desvirtuado.