domingo, 11 de abril de 2010

Advogados assim “Belos”? Não, não há!

É suave sentimento o recordar os mortos. Não desameis o amigo dos túmulos, que esse há-de ser sempre o menor tropeço que vos embarace os prazeres da vida.
Agora direi como veio a ponto este eco das sagradas escrituras.
No último número do MH, ao lado do anúncio da “Cerimónia de Homenagem Aníbal Belo” um brilhante texto assinado por Joaquim Queirós, terminava com uma pergunta: “como seria a humanidade se houvesse por aí mais belos como este Aníbal foi?”
Tive a felicidade de ter nascido no mesmo lugar que ele: Subportela, aldeia do Minho próxima de Viana. E de com ele ter convivido. Era o amigo mais velho e mais instruído que apontava aos amigos os ideais da justiça e liberdade. Utopia! – confessava-me mais tarde. Conheci-o muito antes de – como ele gostava de dizer - se ter aburguesado… e ter vindo para Matosinhos.
Já não há advogados assim. Talvez, o meu amigo Carlos Oliveira – o único jurista que conheço dotado de equivalente riqueza interior. Porque digo isto?
Um cliente abastado, procurava-o e propunha-lhe os seus direitos à propriedade de outrem, que a possuía também com os seus direitos. O jurisconsulto cotejava as razões de ambos, e dizia ao seu cliente que era injusto de sua parte o litígio. Replicava o cliente que as suas razões não eram, bem o sabia ele consulente, inteiramente infalíveis; porém, confiado no talento do seu insigne patrono, esperava vencer a causa, e prometia ser na paga liberalíssimo. Aníbal Belo, redarguia que não aceitava procuração para patrocinar um roubo. O consulente saía, não voltava, e aconselhava os seus amigos a evitá-lo.
Outro cliente, uma dama de ilustre nascimento, procurava o jovem jurista para o encarregar de levar pelos cabelos ao tribunal e à cadeia uma sua empregada que vivia senhorilmente a expensas de seu marido. O advogado, com delicadeza e urbanidade, lembrava à ciosa senhora que o nome de seu marido seria enxovalhado nos tribunais. A dama dizia que não viera pedir conselhos e saía para divulgar que o famigerado letrado indultava a libertinagem dos maridos.
Aparecia depois a empregada, pedindo ao advogado que a defendesse da acusação da dama. Alegava em seu favor as razões que Aníbal adivinhara. Este aconselhava-a a que procurasse ser honesta e laboriosa noutro lugar. A empregada saía dizendo que o doutor Belo só defendia criminosos ricos.
Aburguesou-se depois – gracejava ele. Eu diria que o projecto inicial da natureza foi desvirtuado.

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