terça-feira, 13 de outubro de 2009

Autocrítica

Desde que nasceu, este Blog tem o seu autor identificado. Apesar disso várias têm sido as mensagens recebidas na caixa de correio, desafiando-me a revelar quem sou, de onde venho e para onde quero ir.
Mensagens que obviamente não publico. Por não interessarem nem ao Menino Jesus tais revelações.
Contudo, de quando em vez, aventuro-me a uma autocrítica. É uma atitude que classifico de digna. Tomo-a periodicamente, embora, infelizmente, tal atitude não concorra para melhorar o meu padrão moral. Os vícios estão demasiado entranhados. É-me difícil mudar. Constato que, no respeitante a pecados, sou conservador. Mantenho-os. De qualquer modo, a autocrítica alivia, fica mais barato do que ir ao psicanalista e é menos sórdido do que ajoelhar aos pés de um padre.
Sou preguiçoso e indisciplinado por natureza. Embora apregoe as virtudes do labor e da ordem, chego ao ponto de nem hoje fazer o que já devia ter feito ontem. Nada tenho de desinteressado, como às vezes procuro aparentar e gostaria de ser.
Infelizmente, não resisto à sedução do dinheiro e apenas consigo desprezar as pequenas quantias. Digamos, os trocos. Depois de ler Karl Marx, percebi que tenho muito mais amor ao capital que ao trabalho. Não desdenho as honrarias, ao contrário do que reflectem as minhas crónicas, em que as menosprezo e ridicularizo. As honrarias, claro.
Se não pertenço ao Conselho de Estado, à Opus Dei, Ordem dos Templários, ao Governo ou ao Parlamento, ou mesmo se não sou director de uma estação de televisão, não são as minhas convicções que o impedem - eles é que não me querem lá.

Outro defeito que admito é ser céptico e disfarçado: não só não acredito numa palavra do que dizem os tipos mais inteligentes do que eu, como lhes chamo burros e tento desacreditá-los para ficar satisfeito comigo mesmo. Não é bom ser assim, de acordo, mas não tenho emenda: por mais que aposte e enalteça projectos vanguardistas e me vanglorie de ser criativo, ousado e inovador, nunca passarei de um mísero social burocrata.
Também lamento ser injusto e mal agradecido com numerosas instituições, como a televisão por exemplo. Farto-me de dizer mal dela, sob os pretextos mais fúteis, esquecendo o muito que lhe devemos: graças aos seus programas, muitas pessoas adormecem todas as noites sem recorrer a sedativos.

Mas pior, pior, é ter a língua solta (ou comprida) quando, no fundo, aprecio e valorizo as pessoas discretas e ponderadas no falar. Sofro claramente de incontinência verbal (e escrita), veja-se o meu azar! Insisto em insinuações e, pior que isso, não passo sem escrever coisas perfeitamente inúteis. Como esta.

Há, porém, nestas coisas do dizer e escrever, uma qualidade que, modéstia à parte, devo reconhecer e contabilizar a meu favor: quando não tenho nada para dizer, digo-o. Sempre. Como agora...

1 comentário:

  1. Advogado Leceiro14/10/09 10:41

    Já tive oportunidade de lhe declarar a minha extrema admiração pelo seu estilo de escrita.
    Confesso publicamente ter sido um dos que o desafiou a revelar muito mais do que o nome.
    Respeito a sua posição.
    Quero incitá-lo a continuar. O cinzentismo que por aí anda precisa ser combatido com textos de humor como este. Parabéns.

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